Criado em 2017 em Balneário Camboriú e estadualizado em 2022, um projeto inovador tem oferecido amparo jurídico e apoio humanizado às mulheres vítimas de violência doméstica em Santa Catarina. O “OAB Por Elas”, iniciativa da OAB Santa Catarina, já beneficiou cerca de mais de 10 mil mulheres no Estado, tornando-se um farol de esperança para aquelas que buscam romper o ciclo de violência e reconstruir suas vidas.

"Fiquei sabendo do projeto pessoalmente, na delegacia. Me senti segura e já demos início ao processo." (vítima atendida pela advogada voluntária Ewelyn Brall, identidade preservada)

O acolhimento do projeto ocorre no momento de maior vulnerabilidade, e esse atendimento imediato é um dos pilares da iniciativa. Ao chegar à delegacia, as mulheres recebem orientação jurídica de advogados(as) voluntários(as) inscritos no programa da Ordem. Lá, elas são orientadas sobre como solicitar medidas protetivas e encaminhadas a outros serviços essenciais, como atendimento psicológico e assistência social.

As salas do OAB Por Elas, espalhadas por todo o Estado, foram instaladas pela Ordem para oferecer um ambiente seguro e acolhedor, com mesas de reuniões, poltronas e até mesmo uma mesa para crianças, pois, infelizmente, a maioria das vítimas busca ajuda acompanhada de seus filhos. Preservar a infância dessas crianças é essencial durante todo o processo.

A vida começa quando a violência termina: A origem do OAB Por Elas

O projeto OAB Por Elas nasceu no final de 2017, na subseção de Balneário Camboriú, presidida na época por Juliano Mandelli, atual presidente da Seccional. Criado e desenvolvido por cinco advogadas da Subseção, o programa foi idealizado para garantir que mulheres em situação de vulnerabilidade tivessem acesso ao suporte legal necessário para romper o ciclo de violência e buscar justiça.

O impacto da iniciativa foi tão significativo que, em março de 2022, o projeto foi estadualizado pela OAB Santa Catarina, passando a ser implementado em diversas Subseções do Estado. Atualmente, o OAB Por Elas está presente em 30 subseções e segue em fase de expansão, com a meta de alcançar todas as 53 subseções da OAB/SC até 2027.

Desde sua criação, cerca de mais de 10 mil mulheres já foram atendidas em Santa Catarina. Apenas na subseção pioneira de Balneário Camboriú, foram registrados mais de 3 mil atendimentos em quase oito anos de atuação. Além disso, estima-se que, em cada subseção, sejam atendidas em média 20 a 30 mulheres por mês, dependendo da demanda local.

O presidente da OAB/SC, Juliano Mandelli, reforça o compromisso da instituição com a causa: "O OAB Por Elas é um marco na defesa dos direitos das mulheres em Santa Catarina. Seguiremos ampliando essa rede de apoio para garantir justiça e dignidade a todas as vítimas."

A presidente da Comissão Estadual OAB Por Elas, Patrícia Nicodemus, destaca: "Nosso trabalho é garantir que todas as mulheres tenham acesso à justiça e ao apoio necessário para recomeçar suas vidas. O projeto continua crescendo e expandindo sua atuação."

O impacto da violência e o papel transformador do projeto

Os relatos de vítimas mostram como a violência doméstica afeta não só a vida pessoal, mas também a profissional e emocional. "Após um ano de violência, ainda não consegui focar na minha vida profissional. Foi e ainda é muito difícil lidar com as questões emocionais", conta uma mulher atendida pelo projeto (identidade preservada).

Com uma rede de advogados voluntários, o OAB Por Elas auxilia em diversas demandas jurídicas, desde medidas protetivas até processos de dissolução de união estável, guarda e pensão alimentícia. Nos casos atendidos em Florianópolis, cerca de 20% resultaram em ações judiciais, enquanto os demais casos levaram à concessão de medidas protetivas.

A advogada voluntária Aline dos Anjos compartilha sua motivação para atuar na defesa das mulheres vítimas de violência doméstica: "A violência doméstica e familiar é um fenômeno crescente na nossa sociedade. Ao ver esse cenário, senti a necessidade de fazer minha parte e abraçar a causa, ajudando mulheres em situação de vulnerabilidade, contribuindo para um mundo mais justo e solidário. Acabei descobrindo uma nova paixão: defender mulheres, tanto no Direito quanto na Vida. Precisamos conscientizar a população de que o enfrentamento à violência doméstica é uma responsabilidade coletiva, não apenas do poder público."

A importância de “meter a colher”

Deixar um relacionamento abusivo é um desafio enorme, especialmente para mulheres que enfrentam barreiras como a dependência financeira e emocional. O OAB Por Elas busca minimizar esses obstáculos, oferecendo suporte gratuito e acessível.

"Meu processo ainda não acabou, mas a existência do projeto foi de muita importância. A violência afeta diversas áreas da nossa vida e aspectos sociais. Diria que ainda estou reconstruindo minha vida, e o projeto foi um apoio enorme. Dei graças a Deus que ele existe", compartilha outra assistida (identidade preservada).

Aline ainda reforça a importância do trabalho de conscientização: "A educação é a base para uma sociedade justa e sem violência. Devemos falar cada vez mais sobre o assunto, com o objetivo de conscientização, prevenção, estimular as denúncias, fazer eventos, rodas de conversa e mudar a ideia arcaica de que em 'briga de marido e mulher, não se mete a colher'. Devemos meter a colher, chamar a polícia, acionar a justiça, denunciar sempre que soubermos de qualquer tipo de violência.

OAB Por Elas em Florianópolis

Desde abril de 2023, o projeto OAB Por Elas tem oferecido atendimento jurídico gratuito às vítimas de violência doméstica na Capital catarinense. Os atendimentos ocorrem todas as terças e quintas-feiras, das 13h30 às 17h, na sala da OAB situada na 6ª DPCAMI, onde as mulheres podem solicitar o agendamento diretamente. 

Entre 14 de abril de 2023 e 19 de dezembro de 2024, 221 mulheres foram atendidas pelo projeto em Florianópolis. A iniciativa conta com o apoio de 35 advogados voluntários, que atuam em um sistema de revezamento para garantir um atendimento eficiente e humanizado, sem sobrecarga para os profissionais. Todo o suporte oferecido pela OAB Por Elas é gratuito, reafirmando o compromisso da advocacia catarinense com a proteção e defesa dos direitos das mulheres.

A secretária-geral da Comissão do Combate à Violência Doméstica, Marta Moura, também ressalta a importância do projeto: "A OAB Por Elas é um verdadeiro refúgio para essas mulheres, oferecendo não apenas orientação jurídica, mas também acolhimento e suporte emocional."

Giane Bello, coordenadora adjunta do projeto na Capital e presidente da Comissão Estadual de Direito da Vítima, destacou que o OAB Por Elas tem sido um espaço essencial de acolhimento e acesso à justiça para mulheres vítimas de violência doméstica. “Graças ao trabalho dedicado dos advogados voluntários, muitas mulheres encontram no projeto o apoio necessário para seguir em frente com mais segurança e dignidade. Convidamos toda a advocacia a somar a esse propósito e reafirmamos: nenhuma mulher está sozinha."

Cenário da violência doméstica em Santa Catarina

Os dados extraídos do relatório disponível no Observatório da Violência Contra a Mulher mostram a gravidade da violência doméstica em Santa Catarina e reforçam a necessidade de iniciativas como a OAB Por Elas. Em 2023, foram registradas mais de 125 mil ocorrências de violência contra a mulher no estado, evidenciando a dimensão do problema.

Outro dado preocupante é o crescimento das medidas protetivas concedidas, o que indica uma maior busca por apoio e proteção por parte das vítimas. No último ano, mais de 30% das mulheres atendidas solicitaram algum tipo de medida protetiva, reforçando o papel essencial do suporte jurídico oferecido pelo projeto.

Com um cenário alarmante como esse, o trabalho da OAB Por Elas se torna ainda mais necessário, como cita a advogada voluntária  Ewelyn Brall. “Para mim, é gratificante auxiliar essas mulheres, pois muitas vezes conseguimos trocar o choro inicial pelo sorriso final, ao dar tranquilidade nas orientações”,  enfatiza.

Um projeto de muitas mãos

Coordenado pelas Comissões Estaduais de Combate à Violência Doméstica e Direito da Vítima e OAB Por Elas, o programa também conta com uma parceria estratégica e essencial com importantes instituições como a Polícia Civil, por meio da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, além do apoio contínuo do Poder Judiciário. A junção dessas entidades, formam uma frente sólida no combate à violência doméstica, oferecendo suporte multifacetado para garantir a segurança e a dignidade das vítimas.

Como ser voluntário(a)?

Os advogados(as) interessados em atuar em Florianópolis devem realizar a inscrição até o dia 1º de abril, acessando aqui. O processo exige o preenchimento de informações pessoais e de contato. As atividades na Capital acontecem às terças e quintas-feiras, das 13h às 17h, diretamente na delegacia. Caso haja interesse em participar do projeto no interior do Estado, é preciso ficar atento ao período de inscrições de cada Subseção.

A participação na iniciativa é voluntária, sem vínculo empregatício e sem cobrança de honorários. Os profissionais inscritos deverão encaminhar relatórios detalhados dos atendimentos realizados à Coordenação do Projeto, com base na ficha de atendimento oficial.

Uma mensagem de esperança

Para aquelas que ainda estão em situação de violência, as vítimas que conseguiram romper o ciclo deixam uma mensagem de esperança: "Procure sempre ajuda. Você merece ser feliz e respeitada. A justiça pode te amparar e o OAB Por Elas está aqui para te apoiar nesse caminho."

A presidente da Comissão do Combate à Violência Doméstica da OAB/SC e coordenadora da iniciativa em Florianópolis, Denise Marcon, complementa: "A violência doméstica é um problema estrutural e precisa ser combatido em todas as frentes. A advocacia tem um papel fundamental nesse enfrentamento. Esse trabalho não só fortalece a proteção das vítimas, mas também reforça o compromisso da OAB com a defesa dos direitos humanos e a luta contra a violência de gênero.”