03/03/2006
OAB exigirá decálogo de compromissos para processar perjúrios
A Ordem dos Advogados do Brasil vai promover um painel de debates com cada um dos candidatos à presidência da República, logo após a escolha oficial por seus partidos, em junho próximo. Na ocasião, a entidade pedirá a cada um deles que forneçam um “Decálogo de Compromissos”, contendo os dez compromissos básicos, morais e administrativos de seu governo. “E cobraremos implacavelmente cada perjúrio, podendo, inclusive, responsabilizá-lo judicialmente”, afirmou o presidente nacional da OAB, Roberto Busato. O anúncio foi feito hoje (03) durante o lançamento da Campanha Nacional de Combate à Corrupção Eleitoral, por meio da qual a OAB, juntamente com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), fiscalizará as eleições presidenciais de outubro próximo.
No lançamento do movimento, que conta com o apoio de 17 outras entidades da sociedade civil, Busato se disse alarmado com a sucessão de escândalos, que, desde o ano passado, vêm “enlameando e debilitando ainda mais a imagem de nossas instituições republicanas”. Busato lembrou que é preciso reproclamar a República com urgência, o que só poderá ser feito mediante um efetivo choque de cidadania.
“O comportamento vexatório de grande parte de nossos agentes públicos, profanando o sagrado papel da representação política, nos obriga a uma ação drástica de prevenção social - que é, em síntese, o sentido desta Campanha Nacional de Combate à Corrupção Eleitoral, que estamos hoje lançando”.
Serão instalados, pela quarta vez na histórica parceria entre OAB e CNBB, Comitês de Combate à Corrupção em todo o país, unidades que receberão denúncias de irregularidades nas campanhas eleitorais e informações que possam levar ao flagrante de compra de votos. O candidato que tiver práticas irregulares denunciadas aos comitês poderá ter seu registro cancelado ou, depois de eleito, seu diploma cassado. A OAB colocará à disposição suas 27 Seccionais e a CNBB suas 10 mil e 480 paróquias, dando sustentação logística à campanha.
Durante o lançamento da campanha, os presidentes da OAB e da CNBB, dom Geraldo Majella Agnelo, destacaram a diversidade das irregularidades que normalmente são registradas durante as campanhas, especialmente no tocante à compra de votos. Compra-se voto mediante promessa de emprego público, de dinheiro, cesta básica, saco de cimento, telhas, camisetas, dentaduras e outros penduricalhos, todas “artimanhas” já catalogadas pelo Tribunal Superior Eleitoral como crime de compra de votos.
“Manipulam a miséria, mas não se empenham - nem se interessam - em removê-la. Dela, ao contrário, extraem votos, que perpetuam suas patotas políticas no Poder. O princípio da reeleição - nefasto, deletério, predatório - agravou e multiplicou todos esses males”, criticou o presidente da OAB, que reclamou principalmente do procedimento de candidatos que já ocupam cargos na administração pública. “Governar torna-se um detalhe - muitas vezes incômodo. Para manter as massas sob controle, acionam-se os mecanismos de anestesia social. Anestesia da miséria”.
Como exemplo de “anestesia da miséria”, o presidente nacional da OAB citou os múltiplos programas do tipo “bolsa-isso, bolsa-aquilo, vale-gás, vale-transporte, cheque-cidadão”, os quais taxou de “uma espécie de pronto-socorro social”. “O Brasil não merece isso. Que adianta produzir dezenas e dezenas de programas benemerentes e, simultaneamente, patrocinar e sustentar programas econômicos perversos, desonestos, que multiplicam os ganhos do sistema financeiro e, inversamente, oneram o fator trabalho e inibem a produtividade?”
Para Busato, é preciso, a partir de agora, que o brasileiro seja implacável com promessas vãs, lembrando que é fácil se eleger prometendo gerar milhões de empregos e, depois de eleito, promover políticas que levam ao rumo oposto, sem responder penalmente por isso. “Chega de trapaça. É hora de dar um basta em tudo isso. Chega de impunidade. Para que possamos remover a miséria econômica, precisamos, antes, remover a miséria moral”.
O caixa dois de campanha será a principal irregularidade para a qual os Comitês de Combate à Corrupção Eleitoral estarão em alerta nas eleições presidenciais de outubro próximo. “Mesmo após todas as denúncias de corrupção - todas com raiz no processo eleitoral -, não se criaram mecanismos capazes de impedir a prática do caixa dois. Resta-nos vigiar - vigiar implacavelmente”, finalizou Roberto Busato, acrescentando que o processo eleitoral não se esgota com a colocação do voto na urna.
A seguir, a íntegra do discurso do presidente nacional da OAB, Roberto Busato, na abertura da Campanha Nacional de Combate à Corrupção Eleitoral:
Senhoras e senhores
O que hoje aqui nos reúne – e nos une -, apesar de todos os pesares, é a confiança que temos na força e na vitalidade da cidadania brasileira.
Não é a primeira vez que a sociedade civil, por meio de algumas de suas entidades mais expressivas, vem a público, às vésperas de mais uma campanha eleitoral, manifestar sua preocupação com o futuro da República e de suas instituições.
Aqui estamos, além de OAB e CNBB, velhas parceiras da esperança, em memoráveis embates cívicos, mais 17 entidades representativas de nossa sociedade.
Aqui está o Brasil organizado, sua cidadania vigilante, na defesa do bem comum.
Estamos todos alarmados com a sucessão de escândalos, que, desde o ano passado, vêm enlameando e debilitando ainda mais a imagem de nossas instituições republicanas.
Nossa República – a República de Ruy Barbosa, Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Raimundo Faoro, Tancredo Neves, Teotônio Vilela, Ulysses Guimarães e tantos outros que a sonharam livre, ética e cidadã - está enferma. Está na UTI moral.
Precisamos reproclamá-la com urgência. Mas só o faremos com um efetivo choque de cidadania, que lhe dê conteúdo social, ético e moral.
O comportamento vexatório de grande parte de nossos agentes públicos, profanando o sagrado papel da representação política, nos obriga a uma ação drástica de prevenção social – que é, em síntese, o sentido desta Campanha Nacional de Combate à Corrupção Eleitoral, que estamos hoje lançando.
Estão sendo instalados Comitês em todo o país para o registro de denúncias de irregularidades nas campanhas eleitorais, bem como de informações que possam levar ao flagrante de compra de votos.
O candidato que tiver práticas irregulares denunciadas aos Comitês da OAB e CNBB poderá ter seu registro cancelado ou, depois de eleito, seu diploma cassado.
As irregularidades são amplas e diversificadas. A criatividade do mal, reconheça-se, é espantosa. Inesgotável.
Compra-se voto mediante promessa de emprego público, de dinheiro, cesta básica, saco de cimento, telhas, camisetas e outros penduricalhos, lembrando o procedimento do invasor português quando aqui chegou, no século XVI, trocando a submissão do nativo por espelhos e quinquilharias.
Mas não é só.
Há outras formas, ainda mais criativas – e mais perversas de manipulação eleitoral. Mais criativas porque travestidas de benemerências sociais. E mais perversas porque praticadas pelos governantes, que têm a seu serviço a máquina do Estado.
Manipulam a miséria, mas não se empenham – nem se interessam - em removê-la. Dela, ao contrário, extraem votos, que perpetuam suas patotas políticas no Poder. O princípio da reeleição – nefasto, deletério, predatório - agravou e multiplicou todos esses males.
Em regra, induz o governante a preparar no primeiro mandato a sua recondução e, no segundo, a pagar a conta da vitória.
Governar torna-se um detalhe – muitas vezes incômodo. Para manter as massas sob controle, acionam-se os mecanismos de anestesia social. Anestesia da miséria.
E aí estão para isso múltiplos programas: bolsa-isso, bolsa-aquilo, vale-gás, vale-transporte, cheque-cidadão. Etc.
Sabemos que as condições de pobreza de amplos segmentos de nossa população exigem que se pratique uma espécie de pronto-socorro social.
Só que o desafio da superação da pobreza não pode se resumir a isso. É preciso que os governantes – e os candidatos a governantes – se comprometam com ações desenvolvimentistas, que gerem emprego e renda. Que criem cidadania.
Precisamos inocular no organismo social do país o gen da prosperidade, liberando as energias criativas da sociedade. E o assistencialismo exacerbado que aí está, sem ações de efetiva inclusão social, é parasitário, vil, decadente. Faz lembrar os versos da canção de Luiz Gonzaga, que advertia que “a esmola a um homem que é são/ou lhe mata de vergonha/ou vicia o cidadão”.
Triste condição a que a população mais modesta – e amplamente majoritária – do nosso país está sendo levada: a de cidadãos envergonhados ou viciados. Carentes de cidadania.
O Brasil não merece isso. Que adianta produzir dezenas e dezenas de programas benemerentes e, simultaneamente, patrocinar e sustentar programas econômicos perversos, desonestos, que multiplicam os ganhos do sistema financeiro e, inversamente, oneram o fator trabalho e inibem a produtividade?
É preciso estar atento também – e sobretudo – aos programas de governo que nos estarão sendo propostos. É preciso cobrar dos eleitos responsabilidade ética, social e política – e não apenas fiscal.
Daqui por diante, devemos ser implacáveis com promessas vãs. É fácil se eleger prometendo gerar milhões de empregos e, depois de eleito, promover políticas que levam ao rumo oposto – e não responder penalmente por isso.
Chega de trapaça. É hora de dar um basta em tudo isso. De cobrar responsabilidades. Chega de impunidade. Para que possamos remover a miséria econômica, precisamos, antes, remover a miséria moral.
É a pior de todas, porque gera todas as outras.
A OAB promoverá, como já o fez em eleições anteriores, um painel de debates com cada um dos candidatos à presidência da República, logo após a escolha oficial por seus partidos, em junho.
Só que, desta vez, pediremos a cada qual que nos forneça um Decálogo de Compromissos – os dez compromissos básicos, morais e administrativos, de seu governo, que afixaremos aqui por toda a campanha e, após a campanha, por todo o mandato do vencedor.
E cobraremos implacavelmente cada perjúrio, podendo, inclusive, responsabilizá-lo judicialmente.
Precisamos estabelecer entre nós o princípio da cidadania ativa, colocando-a a serviço de si mesma, vigilante na defesa de seus interesses mais vitais.
Ninguém defende melhor os interesses da sociedade que ela própria. Esse é um fundamento republicano que aqui, hoje, estamos protagonizando.
Não podemos esperar que apenas a Justiça Eleitoral se incumba de supervisionar as eleições, até porque não está aparelhada para isso. A OAB colocará suas 27 seccionais e a CNBB suas 10 mil e 480 paróquias dando sustentação logística a esta campanha.
Esta é a quarta eleição consecutiva em que nos reunimos com este propósito preventivo – e estamos mais estupefatos do que nunca com o quadro de degradação moral do país, embora mais cientes do que antes de que esta ação é indispensável, vital para a sobrevivência de nossa democracia.
Não se iludam, senhores: sem credibilidade, respeitabilidade, nenhuma democracia se sustenta. É do descrédito, do desencanto da sociedade com as instituições democráticas que se nutre a serpente do autoritarismo. E nossa República já provou por vezes suficiente desse veneno para saber que não lhe convém.
Se é ruim com a democracia, pior – bem pior, não tenham dúvida – é sem ela. Sabemos bem disso. Tratemos, pois, de revitalizá-la, de superar nossas falhas e omissões, na certeza de que só se aprende a votar votando, de que só acerta quem não se conforma com o erro.
O testemunho mais dramático a respeito do estado de calamidade moral em que o país oficial se encontra é a constatação de que a campanha eleitoral que se inicia se dará nas mesmas bases da campanha anterior.
Mesmo após todas as denúncias de corrupção – todas com raiz no processo eleitoral -, não se criaram mecanismos capazes de impedir a prática do caixa dois. Resta-nos vigiar – vigiar implacavelmente. E saber, de uma vez por todas, que o processo eleitoral não se esgota com a colocação do voto na urna.
Prossegue no acompanhamento do desempenho do eleito, na mobilização permanente, no exercício implacável da cidadania ativa.
Portanto, senhores, mãos à obra, pois está inaugurada a Campanha Nacional de Combate à Corrupção Eleitoral – e que Deus ilumine o Brasil e os seus cidadãos!
Muito obrigadoAssessoria de Comunicação da OAB/SC



